"É preciso sair do país para enxergar o prestigio e o tamanhão do Benfica em todo o mundo.
Estive três anos em frança, no Marselha, joguei num estádio fantástico, o Vélodrome, convivi com grande jogadores como Papin e Waddle, mas o Benfica estará sempre no meu pensamento. Os meus companheiros de equipa não percebiam muito o meu entusiasmo pelo clube, já que sabiam pouco do futebol português, embora reconhecendo o tremendo historial do Benfica. Durante os primeiros tempos tive de aturar os comentários de Papin, logo desde o inicio, sempre que jogávamos em casa.
Uns dias antes de cada jogo, o Papin chegava para mim e me dizia: "Mozer, vais ver o que é um estádio cheio e um ambiente terrível." Terrível para os outros. Não sei se o se o Papin dizia isso para me intimidar, já que era novo no clube e não percebia muito daquela conversa. Mas para mim, sempre pensava: "Este cara precisava de jogar no Maracanã ou no estádio da Luz, cheios." Era o que eu pensava.
Até que, na taça dos campeões, nas meias-finais, o Benfica calhou no caminho do Marselha. Fiquei, ao início, desgostoso, porque ia defrontar o meu Benfica, o clube que os meus companheiros sabiam que eu adorava. Me lembro de Sauzée, o meu zagueiro do lado me ter perguntado: "Você vai estar em condições de jogar contra o Benfica?" Aí, senti que beliscavam o meu profissionalismo. Nos dois, jogos joguei a duzentos por cento.
Depois do primeiro jogo, em Marselha, uns dias antes de jogarmos na Luz, virei para o Papin e lhe perguntei: " Papin, voçê quer mesmo ver o que é um estádio cheio, com 120 mil a gritar todos para o mesmo lado?" Engraçada a reacção do Papin: "Voçê, está querendo me meter medo, Mozer?" Não estava não e por isso lhe disse para esperar para ver. E já agora, tremer.
Pois bem, chegou o dia, chegámos no estádio da Luz e fomos logo indo para os balneários. Muitos risos, muita convicção de que íamos jogar a final da Copa dos Campeões. Lembro até que Tapie disse aos jornalistas franceses que lhe podiam chamar de Bernardette se o marselha perdesse a eliminatória. Antes de subirmos ao relvado, para o aquecimento, Papin ainda troçou de mim, dizendo que estava já "tremendo de medo". E ria-se bastante.
Os jogadores foram saindo do balneário e eu atrasei um pouco, porque estava colocando uma ligadura no tornozelo. Quando cheguei perto do túnel de acesso ao estádio, começo a ver os meus companheiros, completamente assustados e todos do lado de dentro, não querendo entrar. Só depois percebi que, nessa altura o Eusébio foi chamado ao relvado para receber uma homenagem e foi aí que o estádio quase vinha abaixo.
Logo no momento em que os meus companheiros do Marselha se preparavam para entrar.
Claro que voltaram atrás assustados e me perguntado: "O que era aquilo?".Aquilo respondi eu, é o INFERNO DA LUZ. Aí todos me começaram a me dizer para ser eu o primeiro a avançar, subi as escadas, entrei no relvado, não fui mal recebido e quando olhei para trás, estava sózinho. Espreitando, à saida da escadaria estavam alguns dos meus companheiros do marselha, ainda com um olhar de medo e só nessa altura começaram a entrar. No regresso às cabinas, perguntei a Papin: "Já sabes agora o que é um estádio cheio e um grande ambiente?" A resposta, nunca mais a esqueci: "Mozer, nunca vi uma coisa destas. Tudo isto é incrível. Sempre tiveste razão, o Benfica é ENORME!" Naquela noite, o Marselha perdeu, fiquei triste mas senti orgulho pelo Benfica. E já agora, naquele balneário, fui o único a ter uma vitória. Foi uma vitória moral, sobre aqueles que não acreditavam na grandeza do Benfica. "
Carlos Mozer, citado pelo livro Pela Mística Dentro.
Arrepiante...
Acabaste de me convencer a comprar um livro ;)
ResponderEliminarOra aí está uma daquelas crónicas que nos fazem encher o peito de orgulho, são pequenas histórias destas que devem ficar gravadas a letras de ouro na história do Benfica e não aquelas escritas por quem não sente o Benfica.
ResponderEliminarEsta crónica junta-se àquele pedaço de entrevista dado por António Lobo Antunes sobre o papel do Benfica durante a guerra colonial ;)
Saudações Vermelhas!
Bem podem andrades e osgas virem falar... Crónicas destas (e como bem lembrou o Telmo, a do Lobo Antunes) mostram porque o SLB é o Glorioso e os outros, por mais campeonatos e taças que comprem, nunca lhe chegarão aos pés.
ResponderEliminarA palavra é certa: ARREPIANTE.
ResponderEliminarNão estive nesse jogo mas estive 2 anos antes no 2-0 ao Steua (meias-finais também).
É literalmente... ARREPIANTE.
Eu estive no jogo e foi memorável.
ResponderEliminarO ambiente, a loucura, a festa...ARREPIANTE!!
Só uma rectificação: o livro não é do Mozer, mas do José Marinho, jornalista da Sport Tv, e contém depoimentos de muitos benfiquistas. Já o tenho há algum tempo. Vale a pena ler. Tal como outros, publicados nos últimos anos.
ResponderEliminarÉ pá...vou já rectificar isso.
ResponderEliminarObrigado
Pena é que este inferno não se mantenha em todos os jogos e não só nos grandes :(
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