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Bom ano para todos!!!
Ser do Benfica não se explica, sente-se. É mais que uma paixão, maior que um amor, é um estado de espírito.
O Pequeno Genial
Desculpem maçar-vos com um texto mais longo do que habitual, mas passa-se o seguinte. A prosa que a seguir lerão - os mais corajosos - é a introdução do livro que acabei de escrever e que me preparo para editar. Trata-se da biografia do Chalana. Há discussões que não alimento no futebol. Uma delas é sobre quem terá sido o melhor jogador português depois do Eusébio. Para mim, foi o Chalana. Ponto final, parágrafo. O que vos proponho agora é a publicação, em rigorosa e exclusiva estreia da introdução do livro. É uma história ficcional com que resolvi iniciar a minha homenagem ao mais fantástico jogador português que vi jogar - o Eusébio já não pode considerar-se do meu tempo.
Peço desculpa pelo texto longo, mas creio bem que vale a pena, porque é de um benfiquista para muitos benfiquistas e muitos deles nunca tiveram a felicidade de ver jogar este extraordinário jogador. Sinceramente, espero que não levem a mal e que gostem da homenagem prestada a um verdadeiro símbolo da grandeza ímpar do Benfica.
Introdução
Certo dia, numa feira internacional de botas de futebol, estava na montra principal uma chuteira, considerada o último grito da moda futebolística. Uma bota sofisticada, com todo o luxo a que qualquer actual aspirante a craque da bola julga ter direito. Climatizada, de forma a prevenir odores irrespiráveis, dirigível por controle remoto e até com air-bag traseiro, para prevenir as famosas e perseguidas «entradas por trás». Tinha também, no seu exterior, uns sensores laterais que estabeleciam comunicação com a sua congénere mais próxima. Depois de muitos estudos, os autores desta bota inteligente, ruminaram na instalação de um mecanismo de precisão sensorial, que permitisse aos jogadores uma certeira e rápida circulação da bola. Só faltava mesmo mini-bar e pay-tv. A primeira equipa a utilizar estas sensacionais botas foi o Chelsea de
De súbito, aqueles olhos escondidos atrás de uma densa amálgama de dioptrias, foram abalroados pela confusão reinante na montra ao lado, onde o cotovelo do mais forte prevalecia sobre o tórax do mais fraco. Seguia-se um concurso, promovido pela famosa marca que apostou milhares de euros na certificação da nova e estupenda bota. Tudo não passava de uma acção infalível de marketing, a que se submetiam dez concorrentes escolhidos ao acaso entre o estimável e babado público. Tudo isto, em directo, com as televisões como testemunhas evangélicas do novo milagre da precisão. Os concorrentes eram simples figurantes da escandalosa delinquência publicitária que seria o anúncio da perfeição no futebol. Estavam todos bem calçados, os concorrentes e os multimilionários autores da bota. O objectivo era acertar com uma bola, a uma distância de cem metros, num buraco de perímetro pouco maior do que o objecto atirado. Missão impossível com uma bota normal, nem mesmo à medida dos maiores super-heroís do futebol mundial. Agora, com esta bota, era quase possível colocar duas pessoas nas extremidades opostas de uma montanha a trocar certeiros e infalíveis pontapés na bola. Incrível. Isto, claro, se nos fiarmos no exagerado texto de apoio inscrito num mailing enviado para as maiores sedes de futebol em todo o mundo.
O concurso começou e ao primeiro pontapé, bola fora do alvo. Inquietação generalizada mas convencimento de que tinha sido apenas um pequeno desvio humano na perfeição tecnológica. Como era possível? Os remates seguintes, mais de cem – já que o número de concorrentes alastrou – confirmariam que o futebol não é para todos nem admite a intrusão dos novos pregadores da ciência robótica. Nem um remate certeiro. Em desespero de causa, já com as televisões desmobilizadas, os cabos recolhidos e os anunciantes em fuga, deu-se uma imagem de epilepsia colectiva. Chegavam, entretanto, reforços: a marca desportiva não se dava por vencida e para provar a eficiência do seu invento, contratou a peso de ouro, Ronaldinho, Zidane e Figo para novo teste. Primeiro, o brasileiro dentudo, gingão e melhor do mundo e arredores. Falhou. Pela primeira vez, Ronaldinho perdeu aquele sorriso cinematográfico. Depois, Zidane, com os dedos dos pés apoiados nas extremidades como uma bailarina, voando para a bola, mas aterrando na crua realidade. Novo e estrondoso falhanço. Agora, Figo, avança determinado, verdadeiro Átila dos campos de futebol, faz a paradinha, engana o público e no momento em que todos esperam o estrepitoso embate com a bola, Figo olha para o lado e suspira. Aqui sim, deu-se um momento de viragem. O craque português faz uma diagonal até à montra ao lado e olha para a bota velha e caduca. Parecia já um tamanco, mas Figo colou o seu olhar no menino míope e viu-se a si próprio, nos anos da sua adolescência. Esse recuo no tempo fá-lo reconhecer aquela bota, já que durante muito tempo não se cansara de a ver. É Figo que se lembra que o último homem a descalçar aquela bota tinha sido um fenomenal jogador chamado…Chalana. O seu ídolo
PS: Esta é uma história apócrifa mas que não muda o essencial: Chalana foi o maior jogador português de sempre, depois de Eusébio. Por isso, este livro é a homenagem ao meu ídolo de infância. Resolvi escrevê-lo, um dia, quando o meu filho mais velho me perguntou, depois de ter visto o pai, a entrevistar na televisão, o grande Chalana: «Ó pai, quem era aquele senhor que estavas a entrevistar?». Olhei para ele, com aquela ternura com que o habituei e respondi-lhe: “Filho, ouve bem. Quem é o jogador que mais gostas de ver?» Eu já sabia resposta, mas mesmo assim, soube bem ouvi-la de novo: “O Ronaldinho”, disparou o meu filho, com aquele enfado juvenil de quem é massacrado sempre com a mesma pergunta. “Pois bem, filho, quando eu era da tua idade, o Chalana esteve para mim como o Ronaldinho está para ti”. É para isso que serve este livro.